domingo, 29 de março de 2009

um pouco da gente

Como dizer que te amo? Não sei. Faz tanto tempo que passou a ser clichê falar. São oito anos, me parece. Vimos e nos encantamos, não sei qual vez. Vou contar um pouco da nossa história:
Nos conhecemos. Eu era um quadro em branco, e você um cara que adorava tomar atenções. Conversamos, olhamos e beijamos, sem poder e muito querer, no bar da esquina (moço dificil!). Me apaixonei, voçê idem. Foi bonito. Sofremos e fizemos sofrer. Começamos nossa longa história.Muitos dias, vastas noites. Conversas e descobrimentos, vários momentos.Conhecemos nossos infindáveis segredos. Presenciamos nossos corpos ardentes e rostos serenos.Você era o amor todo que eu buscava, e eu a pessoa que você esperava. Assim vivemos, por grandes tempos. Eramos o mundo, e nós dois. Dois companheiros de vida e mesa de bar. Aprendemos e mudamos juntos. Fazemos parte de nossas histórias, meu companheiro de vida e viagem.
Onde vamos agora? Você vai perguntar onde quero ir, vou responder, não sei. Então não importa o caminho, você completará. Vamos juntos, os três sem saber. O Hugo ainda não sabe que o infinito é inalcançável, mas sabe que fazemos parte dele.

sexta-feira, 27 de março de 2009

me negar?

Pois porque me negarei?
Jamais. Nem que o mundo caia sobre mim!
Se comecei um dia inútil, corrido por um bravo soco nas costas.
Segui com minhas reflexões diárias e indagações repentinas.
Não encontrei todos os meus personagens hoje
O milheiro, na varanda, vi passando. Mas o temakeiro, a puta, o funcionário loiro do metrô, e a catadeira camaleoa, não apareceram.
Tudo bem. Outros vieram.
Em Outro Lugar fui busca-los.
Eu, meu pai, Tomaz, a mulher invisível, Machado de Assis (vulgo nome poesia)
Como posso negar?
Negar a busca, as aparições?
Seria negar a um filho um passeio no parque. Uma judiação.
Só os afazeres diários indispensáveis fariam me negar.

quinta-feira, 26 de março de 2009

curto inicio

"Pestana correu a sala dos retratos, abriu o piano, sentou-se e espalmou as mãos no teclado. Começou a tocar alguma coisa própria , uma inspiração real e pronta, uma polca...os dedos iam arrancando as notas, ligando-as, meneando-as; dir-se-ia que a musa compunha e bailava a um tempo." ( trecho do conto Um Homem Célebre, Machado de Assis).

Tomaz largou o livro na cama, deixando escapar o edredon listrado no chão empoeirado do quarto. Seguiu até a escrivaninha, situada no comodo que servia como depósito da casa. Uma fraca lâmpada amarela iluminava o ambiente cheio de livros, papeis amontoados e objetos perdidos no tempo. Era noite, a casa dormia e acalentava o silêncio do repouso. Enlouquecido pelo repente, Tomaz acelerou em pegar papel e caneta. Achou umas velhas folhas um pouco amassadas e um lápis desgastado. Percorreu no vazio do papel os seus dedos longos e morenos, tomando cada espaço rapidamente. Seu olhar fixo, reforçava sua concentração nas palavras corridas, mesmo com o barulho da chuva que caia e deixava escapar do telhado uma goteira ruidosa. Não ouvia nada, mirou a janela e o descer das águas uma vez, por rápida distração . Transcrevia seus pensamentos sem interrupções.
Quanto ao trecho do conto O Homem Célebre, Tomaz podia considerar uma coiscindente inspiração. Já lera e relera quase todas as obras de Machado de Assis, mas os contos considerava desnecessários, por uma estúpida razão de achar os textos curtos demais, com conteúdos reduzidos. Mal sabia a ponte que atravessara ao começar a ler os rejeitados contos. Começou com Missa do Galo, andou pelo O Espelho e A Cartomante, e não findou o Homem Célebre. Alfinetado pelo desenrolar do último conto, teve sua intuição ordenando a corrida para o refúgio da insônia, inexplorado há muito por falta de devoção....

carolina

eu avisei
nosso amor acabaria no fundo
eu mais só, você ao sol.
nos seus olhos de dor, os meus em prantos.
na benção do amor afobado
nosso rastro partiu.
suas mãos me tocaram em vão.
já se fazia noite
quando seu sorriso escapou.
minhas palavras fugiram
e você na janela carolina,
espera pela volta inerte.
(para meu pai)

Não consegui postar o link da animação Father and Daughter.
Um vídeo que vale a pena parar um pouco pra assitir.
Sensivel, humano, ao alcance da vida de cada um.
Näo pude deixar de lembrar do meu pai, da borboleta azul que ronda até hoje nosso igarapé. Nos separamos para nos encontramos em nossas memórias, nossas ruas e histórias. Um pouco de Carolina.

violência invisível

Estava andando, leve e distraída, quando uma mulher em sentindo oposto caminhava na minha direção. Não a notei, ela sim havia percebido minha presença incomoda naquele inicio de tarde. Eu pensava onde ia almoçar, não tava afim de preparar nada e decidi que iria comprar uma salada e come-la em casa. No intermédio dos meus anseios, meus passos largos, a roupa casualmente fresca, se não fosse um pequeno furo na minha blusa (imperceptível), meus óculos escuros e cabelos rabo-de-cavalo, denunciavam uma pseudo representante da burguesia do bairro da Liberdade, em São Paulo. A outra, vinha sorrateira, sem alarde, na minha reta, pensando tudo, menos no futuro. Senti um choque nas costas, acompanhado de uma dor surpreendente. Paralisei por meio segundo e avistei aquela mulher de andar firme, mais ou menos da minha idade, antes invisível, com uma aparência de maloqueira (termo usado em são Paulo para designar moradores de rua), cabelos crespos e curtos, corpuda, de veste preta e surrada, sumindo entre os pedestres. Ela passou por mim, socou minha lombar falando algo que não entendi, e continuou sua trajetória sem olhar para trás, deixando de verificar o dano causado e a reação da sua vitima aleatória. Num súbito momento insano me preparei para correr atrás dela. Que loucura! Pegar uma guria dessas, seria como correr atrás de uma violenta surra ou coisa pior. Parei, respirei, ninguém viu aquilo, nem uma alma pra me consolar dizendo: calma, ela sempre faz isso, e é perigosa, ainda bem que você ficou quieta.
Continuei meu percurso atordoada e, agora, atenta. Todos que passavam na minha frente e atrás, se transformaram em agressores em potencial. Fechei meu punho e segui adiante. Uma lágrima furtiva caiu. Me sentia humilhada, brutalmente violentada. Nunca apanhei na vida, nem dos meus pais, quiçá as chineladas da minha mãe, que só me faziam rir de tão inofensivas, e as brigas com meus irmãos, que também não contam. Comecei a compreender, que na verdade, a maloqueira não bateu na Patrícia, pois não a conhecia, se tivesse oportunidade, talvez não o fizesse. Na verdade, aquela alma perdida atacava a sociedade boçal que a ignorava. Sabe lá o que passou na cabeça dela. Geralmente quem bate apanha, ou já apanhou. Fui o alvo perfeito, um ser (talvez pra ela) incapaz de uma reação a altura. Tão logo, me senti importante, julgada em alguma instancia por aquela pessoa infeliz. Espero profundamente, não encontra-la mais. A probabilidade existe, já que faço o mesmo trajeto todos os dias, em horários diferentes. Quem sabe já tivessemos nos cruzado?!Não vi seu rosto, não tenho como reconhece-lo. Seu ato feroz ficará gravado em mim, com um arroxeado em minha pele, que logo sumirá, e a lembrança de uma violência gratuita, menos grave do que essas que ouvimos falar todos os dias nos noticiários. Me senti vítima e algoz de uma sociedade que anda sem notar os indivíduos invisíveis. Eles procuram ser vistos e se expressam da sua maneira, reproduzindo seus delírios.

domingo, 15 de março de 2009

Musica e literatura

Sábado de uma semana qualquer. Subi as ladeiras um pouco atrasada, parei na bilheteria do teatro e pedi um ingresso. Perguntaram se era só um mesmo, não entendi, respondi que sim, quase continuando com um por quê. Muita gente bonita, e descolada. Consegui a infeliz proeza de sentar na última fila, cadeira M7. Um rio de cabeças abaixo da minha visäo, imaginava o que se passava em cada uma, cada cabeça um mundo. Estava eu em uma galaxia, esperando começar o show do Moraes Moreira. Vi aquela figura corpuda e cabeluda, de óculos escuros, um personagem. As músicas do primeiro disco dos Novos Baianos, lançado em 1968, abriram o show, intercaladas com citaçöes de trechos do livro que estava sendo lançado naquela noite: A história dos Novos Baianos e outros versos. História, poesia e música, me senti em casa. Moraes Moreira sem nenhum auxilio, declamava páginas do livro. Comecei a perceber que ele o havia escrito, pois decorara as centenas de palavras perferfeitamente encaixadas.
Adoro biografias, mas nunca confio intereiramente nelas, pois o olhar de um escritor de biografia está impresso em cada linha, por uma lógica do autor. Desconfio da imparcialidade. Desconfio da realidade, mas adoro as histórias dos outros.
O show acabou com as 400 pessoas em pé, dançando Flor de Maracujá.Näo comprei o livro, e a noite terminou emendada com o dia, regada a cerveja e boa companhia. No meio da noite, me lembrei de uma observaçao clichê de Moraes Moreira "Se Deus me aparecesse e me oferecesse a oportunidade de mudar algo na minha vida, eu diria - ótimo, se eu posso mudar algo faria tudo de novo"

quinta-feira, 12 de março de 2009

despertar da madrugada

Apesar do sono, acordei no inicio da madrugada. O sonho tinha sido bom, mas näo lembrava de nada. Aquela sensaçäo de sonho presente fazia meu pensamento permanecer sereno. Levantei para acender um cigarro, desisti. Liguei a televisäo, filmes, seriados, sexo e um concerto musical, parei de cutucar o controle remoto. Joäo Carlos Martins conduzia no piano Ennio Morricone, Cinema Paradiso. A cada nota dada com uma de suas mäos cerradas, fui compreendendo as contrariedades da vida. Um näo a sua natureza, pode significar todo o sim. Contrariar o que nos é inerente, nos torna sordidos, desleais a nós mesmos. Paixäo, este sentimento me despertou. Uma palavra que move o mundo. O sono me acariciava a cada música, e ao final de Adios Nonino de Astor Piazzola, decidi voltar pra cama. O sonho que há pouco esquecia, estava claro. Lembrava de tudo.

terça-feira, 10 de março de 2009

Changes

Mudança: participa o tempo todo da nossa vida.
As mudanças geralmente aparecem de duas formas: quando por algum fato inusitado, você sem querer é obrigado, por um acaso; ou você simplesmente, por instinto, e/ou por vontade, decide mudar.
Eu mudo täo facilmente, que nem percebo. Por instinto, vontade e fatos cabalisticos. A mudança, me vem sorrateira, solteira, solene. Eis a questäo: modificar ou näo?

sábado, 7 de março de 2009

pati por lio

Venho de algum lugar. Adoro pessoas.
Imagino o mundo o melhor possível, e tento fazer dele o mesmo.
Amo todos sem prescriçäo. As vezes me dou mal.
Levo a vida, como quem leva nada e sempre o bastante.
Nunca escrevi poesia.
Enfrento muito mais valente. Choro melhor e realmente.
Sorrio quando me dá vontade e fecho a cara quando posso.
Meus amigos säo importantes. Minha família me fortalece.
Descobri Piazzola a pouco.
Por muito pouco fico triste, e por menos ainda: feliz.
Prefiro ser feliz a ter razäo, mas adoro tê-la.
Trabalho muito e amo demais.
Näo sei viver sem prazer. Se acho pouco, pego mais.
Me apaixono todo sempre.
Uma frase inventada: Viver envelhece, mas faz bem.

terça-feira, 3 de março de 2009

A manteiga

Estavam todos na sala reunidos, quando um dos convidados levantou e perguntou a dona da casa.
"Onde fica a manteiga?" Melia de imediato respondeu. "Em cima da mesa da cozinha".
Havia muito tempo, näo conseguia reunir todos os saudosos amigos em sua terra alheia. Melia nasceu em 1950 na cidade de Igarape-Miri, no estado do Pará, e morava há 20 anos na capital paulista. Alguns dos amigos estavam na cidade especialmente para conhecer a grande metrópole e outros para comemorar os 50 anos da amiga. Naquele dia, Melia escutou todos os assuntos novos e velhos, além do sotaque cantado que a tempos se tornara peculiar. No total eram seis convidados. Quatro homens e duas mulheres. Dois ex-namorados e uma, Susana, antiga paixäo.
Roberto levou a mantegueira até a mesa da sala. Todos ansiavam comer a especialidade gastronômica de Melia, que tinha acabado de sair do forno: päo caseiro com a mortadela do Mercado Municipal. Quando Roberto abriu a mantegueira, a manteiga estava com a cor amarelo-vivo, mole, com gorduras derretidas. Näo sentiu nenhum estranhamento. Melia achou aquela manteiga uma afronta, em pleno inverno. Fazia um dia ardorosamente quente. Ela näo entendia um dia de veräo em pleno mês de agosto em Säo Paulo.
Para Melia a manteiga era seu termômetro. Sabia identificar através dela as quatro estaçöes: primavera, veräo, outono, inverno. Observava tudo pela consistência da manteiga.
Morou os 30 anos iniciais de sua vida numa cidade de temperatura constantemente escaldante.
Em Igarape-Miri a manteiga, o ano todo, tinha o aspecto maleavel e gorduroso. Nesse tempo, Melia achava que a manteiga só tinha uma consistência: a mole. Uma de suas primeiras impressöes quando chegou em Säo Paulo, em junho de 1980: a manteiga. A viu em cima da mesa, na casa da sua tia Mona, uma simpática velhinha solteirona. Mona morreu 5 anos depois que sua querida sobrinha mudou de cidade especialmente para cuida-la. Melia näo conseguia passar a manteiga no päo quentinho que sua tia tinha acabado de preparar para recepciona-la. Perguntou a Mona porque guardava a manteiga na geladeira, já que ficava täo dura e consistente, impossível de passar no päo. A velha tia gargalhou e em seguida sussurrou. "Oh minha filha! Você ainda é muito ingênua, ainda tem muito a aprender na cidade grande". Melia ficou sem entender, mas ficou quieta. Näo queria aborrecer sua tia.
Uma carta de Mona em maio de 1980, salvou Melia da confusäo que sua vida se tornara depois que a libanesa Susana declarara seu silencioso amor. Uma loucura de prazer e culpa revirava seu corpo. A cidade desconfiou. Duas belas mulheres rodopiando nas tardes ensoloradas. No igarapé, nos bancos da praça, nos terrenos baldios. A reputaçäo de Melia estava arruinada.
A carta dizia assim:
" Minha querida sobrinha,
Näo sou muito boa nas palavras, mas minha saudade de Igarape-Miri vence todas as barreiras. Näo tenho mais saúde de ir até minha terra e rever meus belos momentos. Näo tenho herdeiros e ninguém pra me acolher. Gostaria que você viesse pra cá, morar. Faria bem pra você, e pra mim. Nós, pobres mulheres solitárias.
Aguardo sua presença e deixo cruzeiros para sua viagem."
Os pais de Melia acharam a idéia pertinente. Afinal, vislumbravam enfim um futuro palpável para a filha solteira e perdida. Melia passou quase 4 dias dentro do ônibus. Chorou nos dois primeiros. No terceiro dia começou a sentir o friozinho das terras do sul e se animou. Conseguiu comprar um fino agasalho no meio do caminho. Terminou a viagem aquecida com pequenas doses de pinga e um velho cobertor que lhe acompanhara a travessia toda.
Susana ficou desolada. Uma semana depois do brusco adeus de Melia, se entregou a Igreja da comunidade, deixando as beatas senhoras escandalizadas.
Depois de 20 anos, Susana, Melia e todos os velhos amigos estavam juntos outra vez. No meio disso tudo, a pobre manteiga inconsistente, naquele estado, em pleno inverno, näo era coerente.
Todos riram com as observaçöes de Melia sobre a manteiga. Apenas uma pessoa näo riu. Susana estava seria e envelhecida. Sua boca enrugada se abriu e falou. "A manteiga insistentemente em nosso päo de todos os dias. Mole e impregnante quando se esbarra na faca, suja a toalha da mesa e nossos dedos, e enfim penetra no päo. Näo poderia jamais endurecer".
Ficaram todos uns segundo paralisados, sem compreender.
Depois riram até o final do dia.

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